Vá e vença: como o BOPE entrou na vida de dois jovens corredores
A corrida sempre fez parte do dia a dia do BOPE – Batalhão de Operações Policiais Especiais da PMERJ. Nas provas a que são submetidos os candidatos a ingressar na unidade de elite (Curso de Operações Especiais e Curso de Ações Táticas), além da parte médica e psicológica, também é realizado um teste de habilidades específicas, em que, além de barras, abdominais, transposição de obstáculos, equilíbrio e natação, é realizada uma corrida de 10km.
Realizado nas Estrada das Paineiras, num percurso de 4km de subida e 6km de descida, o teste deve ser concluído em no máximo uma hora. Todos os testes são eliminatórios.
“Após a conclusão dos cursos, a rotina diária de um policial do BOPE também exige a manutenção de seu condicionamento físico e sua saúde. Os nossos policiais, além de um treinamento específico para cada atividade, também contam com um apoio médico e nutricional. A corrida faz parte deste treinamento”
explica o 1º Sargento André Lopes, um dos coordenadores da Equipe de Corridas do BOPE.
Segundo André, a inserção da equipe de corridas do BOPE no universo das corridas de rua e das assessorias esportivas aconteceu naturalmente. Hoje o BOPE recebe a visita de assessorias para treinos em conjuntos e isso faz parte da política de aproximação à população.
“Nossa equipe de corrida está crescendo! Nós sempre corremos,há policiais antigos que correm há muito tempo, mas nunca tiveram uma oportunidade como esta. O esporte está crescendo, se especializando, e nós não podemos ficar pra trás. A corrida está em todas as classes sociais. Vemos as equipes da Rocinha e da Comlurb, entre outras, com atletas de ponta. É gratificante saber que podemos fazer parte deste mundo”diz o policial-corredor.
André vê nas corridas o cenário perfeito para intensificar a política de aproximação, já que a corrida de rua é um ambiente altamente democrático. Segundo ele, é um prazer ver comunidades como Alemão e Rocinha interagindo com os policiais-corredores do BOPE.
“Para a Polícia Militar isso é muito importante. Para nós, do BOPE,é ainda mais especial. Quando passamos com nossos uniformes pretos ouvimos os gritos dos moradores: VAI CAVEIRA! E certamente nós interagimos, por que há bem pouco tempo isso era realmente impossível. É nas corridas também que recebemos o carinho da população. Muitos nos abordam e nos parabenizam pelo trabalho que fazemos”
Mas nem só de ‘caveiras’ é formada a equipe de corrida do BOPE. Atualmente, duas jovens promessas do esporte integram a equipe e usufruem dos apoios que os corredores do BOPE recebem, com toda a justiça. E é preciso ser ‘osso duro de roer’ – como diz a música – para não se emocionar com a história de Viviane Santana, de 17 anos.
A jovem corredora, uma semana antes de completar 12 anos perdeu seu pai, assassinado durante um assalto. E por conta das ironias da vida, foi exatamente a violência urbana que a levou a conhecer as pistas, em 2005, o que sete anos mais tarde a levaria a compor a equipe de corredores do BOPE.
“Eu precisava ocupar de forma saudável meu tempo ocioso e, de certa forma,esquecer meu sofrimento em relação à perda de meu pai. Recebi um convite para praticar esportes no colégio e comecei a treinar em 2005. Bem, eu achava que treinava até conhecer, em 2009, o Luis Paulo, meu treinador até hoje. Com ele aprendi a ter disciplina, a ser determinada e a não ter medo da dor”, afirma Viviane, com um amadurecimento que chega a impressionar.
Não fosse a disciplina, a determinação e a coragem para enfrentar a dor, certamente Viviane já teria desistido do esporte.
“Comecei a trabalhar aos 15 anos porque precisava ajudar a sustentar minha família. Somos eu e minha irmã trabalhando para ajudar nossa mãe que é desempregada e nosso irmão ainda criança. Além de termos de pagar aluguel, não temos nenhum tipo de pensão de nosso pai, pois ele trabalhava por conta própria. Durante anos conciliei os estudos pela manhã, os treinos à tarde e o trabalho à noite”
Mas o que já era difícil ficou ainda mais. Mas também mais desafiador. Viviane entrou para a universidade e está cursando Nutrição. Então, na movimentada rotina, acabou entrando o estágio.
“O tempo de treino à tarde pasou a ser do estágio e tive que começar a treinar à noite, logo após o trabalho. Às 22h30, meu treinador me leva para treinar na Vila Militar e só vou dormir depois de meia noite, tendo que acordar cedo no dia seguinte para reiniciar minha rotina”, conta a corredora.
Viviane sempre alguns motivos para desistir do esporte, mas seguiu adiante e ao seu vitorioso currículo das pistas – em Jogos Estudantis ou em competições oficiais está sempre entre as melhores – , a atleta acaba de acrescentar a vitória nos 5km do Circuito Adidas. Logo em sua primeira prova.
“Este ano já estava muito complicado e eu já pensava em desistir, quando o Dantas (Sargento Sergio Dantas) e o BOPE surgiram em nossas vidas e nos apresentou à loja Mundo Corrida, que nos dá apoio para seguir nossa batalha. Para muitos pode parecer simples, mas para mim, ganhar dois pares de tênis para treinar e competir é diferença para conseguir realizar o sonho de ser atleta”, completa Viviane.
Outro atleta que quase desistiu do esporte completa o time de corridas do BOPE. Bruno William, também com 19 anos, foi descoberto pelos ‘caveiras’ praticamente dentro de casa, participando de um projeto no CEFAP – Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças da Polícia Militar do RJ – , no bairro de Sulacap.
Bruno, que mora no Lins com os pais, descobriu o atletismo aos 14 anos, perto de casa, através de um projeto na praça.
“Fiz testes para entrar no projeto. A professora que se mostrou encantada comigo, e eu, ao mesmo tempo, encantei-me com o atletismo. Segui treinando e até ganhei um festival de atletismo realizado no CEFAP. Até que um dia esse projeto acabou. Todos os atletas foram desistindo, um a um. Fui o único a ficar, com meu amor pelo atletismo e sabendo que poderia chegar mais longe. Fui então indicado a um projeto de atletismo que funcionava no CEFAP”
conta Bruno. “Lá conheci o treinador Luis Paulo. Com ele, confesso ter evoluído e que, apesar da intensidade dos treinos, passei a sentir um prazer ainda maior com o atletismo. Tudo isso ainda aos 13 anos de idade”, completa o corredor.
Aos 17 anos, Bruno ganhou uma vaga para estudar no CEFET – Centro Federal de Educação Tecnológica -, o sonho de muitos jovens nessa idade. Mas Bruno teria que optar entre o CEFET e o atletismo. Venceu o esporte.
A escolha não foi fácil e Bruno precisa convencer a família de que havia acertado na escolha.
“Eu me mantive firme nos treinos, alcançando muitas vitórias. Mas com 18 anos aumentaram as responsabilidades. As cobranças aumentaram em casa. Precisava trabalhar, ajudar de alguma forma e o atletismo apesar das conquistas estava sem incentivo. Recebia muito pouco, mal dava para passagem. Isso me fazia pensar em desistir. Mas o professor Luis Paulo sempre fazia o possível ajudando com alguma coisa que precisava e com muito incentivo”, conta Bruno.
Atualmente Bruno cursa Educação Física e precisa conciliar os treinos com as aulas e o estágio e confessa ter pensado, mais uma vez, em deixar os treinos de lado, justamente no ano em que foi campeão estadual dos 1500m em todas as categorias.
Antes que Bruno desistisse apareceram os corredores do BOPE e a Loja Mundo Corrida.
Assim a história de Viviane e Bruno continua nas ruas do Rio. A missão que os corredores do BOPE deram a Bruno e Viviane é simples: “Vá e vença!”. E como missão dada é missão cumprida…